quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Onde (talvez) tudo começa

Eis que agora faço o que deveria ter feito há muito tempo, julgando o que já passei e provavelmente não terei a precisão pra narrar. Como provavelmente se nota, ou ao menos se supõe, não escreverei pensamentos bonitos em forma de prosa (mesmo que provavelmente eu fosse capaz disso), tão pouco narrarei acontecimentos do meu dia-a-dia (os quais, devo dizer, poderiam entreter da mesma forma. Vida insana...), mas sim minhas viagens e seus respectivos aprendizados, de uma forma crua, direta e sincera (salvo detalhes sórdidos).

Não começarei contando minha primeira grande viagem, a qual já está narrada em outro blog, nem minha segunda (durante a qual eu tava ocupado demais vivenciando pra conseguir escrever algo *burro*), mas contarei do lugar no qual meu corpo me contou pra que ele realmente foi feito, lugar o qual eu aprendi o real sentido de viajar: Montevideo.

Minha primeira vez lá foi em um mochilão no qual eu passei por Buenos Aires antes, e só fiquei cerca de dois dias lá, passei como eu nunca deveria ter passado por qualquer cidade na minha vida: despercebido.

Na segunda, na qual passei um final de semana, aprendi o real sentido de estar viajando...

O comum de nós, em viagens, é andarmos pelas ruas, provavelmente falando nossa própria língua (salvo comunicações em forma de mímicas e murmúrios em algo como uma mistura de línguas, como se a outra pessoa fosse capaz de entender se falássemos mais alto ou de maneiras diferentes), visitando museus, prédios, praças ou qualquer outro ponto indicado por um número ou letra no mapa turístico especialmente direcionado pra ti. Dessa forma, passamos reto por algo mais complexo, mais intenso e provavelmente mais surpreendente do que cada um dos prédios os quais nos rodeiam, o povo. Cada pessoa que passa por nós, (em passos apressados de quem está pouco se fodendo pros prédios), enquanto olhamos atônitos o que nos é novo, é completamente diferente da pessoa que passará a seguir, mas muito provavelmente, semelhantemente entre eles, sejam MUITO mais diferentes de ti.

(“People travel to faraway places to watch, in fascination, the kind of people they ignore at home.” – Dagobert D. Runes)

Conto aqui, então, não o quanto eu me maravilhei com as construções, povo ou festas (o que de fato aconteceu), e sim a história de um aprendizado noturno, e como ele veio a acontecer.

Começo em uma noite (tudo acontece de noite) de algum mês (nunca me importei com datas mesmo, agradeçam que eu saiba que era 2010), estava eu sentado no terraço do albergue com três amigos com os quais eu estava viajando, virando alguns shots de tequila. O efeito major do álcool em mim, fato o qual qualquer amigo ou conhecido pode comprovar, é o ímpeto pela socialização (e contabilizo um aumento de 300% desse efeito em albergues/terras estrangeiras), nunca então que eu teria a capacidade de ver inúmeras pessoas tomando uma vodka na mesa ao lado e não ir realizar algo como uma troca de bêbidas, informações e outras coisas(ná!). Bom, o efeito dos destilados em grupos de pessoas conversando provavelmente é bem conhecido por qualquer um que esteja se prestando a ler esse texto (seja por experiência própria ou por notares como as pessoas estão se divertindo enquanto ficas no canto, twittando pra ninguém...!), então obviamente não preciso (até porquê eu não conseguiria) explicar como se desenrolou o resto do começo da noite (talvez algumas marcações da minha pessoa em fotos de estrangeiros no facebook me ajudariam a explicar, e pensando agora, vou anexar, pra ilustrar o momento), mas de alguma forma, de repente tinham inúmeros uruguayos no albergue, e mais de repente ainda estávamos em um grupo de umas 20 pessoas andando (levemente cambaleantes) pelas lindíssimas ruas da Ciudad Vieja montevidense, dentre os quais, apenas um dos três amigos iniciais (Eneko Arrondo: espanhol, feliz e péssimo dançarino), o qual se mostrava extremamente apreensivo, principalmente quando eu contei pra ele que os "guias" uruguayos estavam errando o caminho pra festa, de acordo com o traço preciso que o mapa turístico amassado e praticamente extraviado, no meu bolso, indicava, atravessando sem dó os numerozinhos que figuravam lugares que não vim a entrar. No momento, pensei, "foda-se" "dane-se" , me perder não vou, tenho um mapa (gênio!), foi quando resolvi usar de toda minha habilidade social cara-de-pau pra pedir pra dar uma volta no skate de um dos uruguayos (eu sei que eu não tinha citado antes, mas o cara tava levando um long board pra festa...). Subi naquela prancha, levemente alcoolizado, e comecei a descer as maravilhosas ruas inclinadas. Outro efeito o qual provavelmente muitos conheçam do álcool, é que em determinado momento ele te deixa extremamente pensativo e atento a detalhes...
A maravilhosa Absolut Pears
Exatamente nesse momento, nas primeiras embaladas, a medida que as vozes falando espanhol se distanciavam de mim, estalou algo dentro de mim, comecei a admirar a beleza da rua, com o glamour das construções antigas (passando em uma velocidade possivelmente perigosa por mim), beiradas por uma linha em cada lado da rua de árvores com folhas a rarear (devia ser inverno), com suas copas inclinadas ao meio da rua, por onde eu passava voando. Perante aquela visão que me fazia lacrimejar (era o vento batendo no olho), pensei comigo mesmo que eu estava conhecendo as ruas da ciudadela de uma maneira que possivelmente nenhum turista veio a conhecer, em cima do skate de alguns uruguayos, em plena madrugada, e sinceramente, devo dizer que todos deveriam tentar conhecê-la assim, o sentimento foi realmente inexplicável (se não souberem andar de skate, tentem simular a velocidade, correndo), eu não estava apenas visitando a cidade, fiz parte dela, mesmo que por alguns momentos, me fiz conhecer (até porquê não deve ser difícil de lembrar do brasileiro aleatório que pediu o long e saiu insano descendo ruas desconhecidas, de noite!). Imagino que essa seja a diferença entre um viajante e um turista.

Apesar do sentimento bom, não é muito comparado com o pensamento que tive ao chegar no albergue, olhar pela janela do mesmo e ver o sol nascendo, olhar pra baixo e ver as pessoas começando seus dias de trabalhos, e olhar pra trás e lembrar o desenrolar da noite maravilhosa, a qual só teve aquele desenrolar, pelo simples fato de eu ter conversado com as pessoas da mesa ao lado. Com essa visão e esse pensamento ocupando minha mente, foi naquela sacada, naquele nascer do sol, que eu percebi do que eu era feito, pra o que eu fui feito e como eu pretendia viver o resto da minha vida, foi como amadurecer anos em um segundo. As viagens que antes eram algo que eu pretendia fazer o resto da minha vida, se tornaram, de repente, a essência da minha vida. Ainda sou novo e simplesmente estou construindo o modo como pretendo viver, mas desde então, vivo cada dia sabendo exatamente como devo viver, e nunca me perdoaria de não perseguir isso.
                                                        

          

16 comentários:

  1. Basta saber quem é o tal Pablo pra ter certeza de que ele É exatamente o que está escrito. Não é turista. Verdadeiro viajante.

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  3. Íncrivel o texto,expressasse bem tua viajem através de palavras.Já fui em montevideo e sei como é ''foda''. Abraço

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  4. Tag - VODKA

    foda, pablo versão poética. massa

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  5. aaaaamei! posso participar? será que consigo acompanhar? ...
    admiro muuito essa tua persolanidade de VIAJANTE! :)

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  6. "Bom, o efeito dos destilados em grupos de pessoas conversando provavelmente é bem conhecido por qualquer um que esteja se prestando a ler esse texto"

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  7. "Outro efeito o qual provavelmente muitos conheçam do álcool, é que em determinado momento ele te deixa extremamente pensativo e atento a detalhes..."

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  8. "eu não estava apenas visitando a cidade, fiz parte dela, mesmo que por alguns momentos"

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  9. Só tenho pra te desejar tudo de bom e te dizer que como sabes muito bem, ninguém que te conhece e que aprende a te admirar, jamais vai esquecer de ti. Ninguém te conhece melhor que tu mesmo. Mas, todos te conhecem o suficiente pra se apaixonar por ti. Sério, Pablo (vulgo "Aquarius") toda sorte do mundo nas tuas viagens, histórias, pessoas, lugares, árvores, prédios e... quem sabe... "paixões".

    Tenta não esquecer NUNCA de quem não vai esquecer de ti. Sabes bem quem são essas pessoas.

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  10. Pabloooo,
    Que texto bom...Nossa quer dizer que enquanto eu e Roberta desistíamos e pagavamos um taxi para Pocitos, tu descobria a tua vida?? Que coisa hein...
    Aquela viagem foi ótima mesmo...Depois dela também tenho colocado os trânsitos por lugares que não conheço nas minhas metas e REALIZAÇÕES Muito, muito, bom...Ainda lembro daquela Absolut de Pera, descobrir as novelas brasileiras famosas em Valparaíso e tu lá, todo Avatar, cantando: Donde van a ir después? Donde Van a ir Después?
    hahahahahahahaha

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  11. De fato, Montevideo é incrivelmente incrível! Com todo seu charme, suas ruas sem fios, suas praias sem ondas, e as noites frias de dias quentes.
    Quando me aconteceu de parar por lá eu tive experiências muito ruins que me fizeram acordar pra umas coisas da vida (talvez seja uma mágica dessa cidade, nos fazer ver além daquele véu que o cotidiano nos põe nos olhos, nos fazendo acreditar que daquele jeito tudo está certo), e mesmo assim, quero vê-la de novo.
    Sobre sua mais recém descoberta vocação, eu concordo com tudo! Acho que você é demais pra caber em um só lugar, cidade, país. Aos expansivos, a expansão! E o mundo precisa de gente assim, que une as pessoas; que nos convida à sair por aí, descendo ruas desconhecidas num longboard aleatório; que nos faz refletir sobre a facilidade de urgir amizades de situações das mais inusitadas.
    Só te desejo boa sorte, e te peço uma foto dedicada pra sua amiga paulista louca que te tanto gosta!

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  12. Parabens pela viagem, pablito!

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  13. Muito bom.. Muito interessante..

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  14. Caramba! Puta merda! Tchê, que texto bom de ler.
    Tu és ótimo escritor.
    E te conhecendo - mesmo que pouco - do jeito que já te conheço aposto que ias estar na mesa ao lado mesmo sem álcool no sangue. Hahaha! Tu é fantástico!
    Espero que um dia possamos nos encontrar em uma dessas viagens... (provavelmente isso vai demorar um pouco, mas não será impossível. Hehehe.)
    Boa sorte na tua jornada!
    Um beijão, Carolina Scholl.

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  15. nao sei se consegui apreciar a mesma visão que a tua, mas independente de viajante ou turista, Montivideo vale mt a pena mesmo! quero voltar ainda... mais de uma vez se possivel :D

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